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Tadeu Veron

O abandono dos esquecidos: as dificuldades dos montadores em tempos de pandemia

Tadeu Veron

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Embu das Artes é famosa Brasil afora não apenas por seu ar de cidade interiorana, sua paisagem bucólica, seu centro histórico com sua beleza barroca. É conhecida por atrair dezenas de milhares de turistas nos fins de semana graças a feira de artes e artesanatos, onde os turistas encontram ótimos restaurantes, incríveis lojas de móveis rústicos, galerias de arte e é claro nossos artistas e artesãos expondo seu talento em nossa tradicional feira de artesanato.

Entretanto há toda uma classe de trabalhadores que é pouco ou quase nada lembrada quando pensamos na feirinha: os montadores. Afinal de contas quem são os montadores?

Para que os turistas que possam chegar nas manhãs de sábado e domingo é necessário que a feira já esteja montada, que o material dos artistas já estejam expostos, para isso é necessário todo um trabalho humano, logístico e de infraestrutura no decorrer da madrugada. Então vou relatar um pouco da nossa rotina de trabalho: Começamos a trabalhar na madrugada de sexta para sábado por volta das 2 ou 3 da madrugada. Os bares no centro estão quase fechando, ainda é possível escutar os cantores tocarem as últimas músicas de seu repertório que são baseados nós últimos sucessos do sertanejo universitário, nos deparamos com os garçons fazendo seu trabalho final de limpeza, alguns bêbados passeiam pela praça e jovens casais se beijam em algum canto escuro qualquer.

A montagem da feira consiste em trazer as ferragens e lonas para montar as barracas, as tábuas ou esteiras que são usadas como suporte onde o artesão irá expor seu trabalho, e geralmente é nossa responsabilidade trazer o material do expositor, pois vale lembrar, muitos deles não moram na cidade, alguns sequer tem carro para trazer malas e bolsas pesadas com sua mercadoria, então é mais conveniente pagar para os montadores para guardar seu material. Com a especulação imobiliária que existe no centro o preço dos aluguéis de depósitos são elevados (que muitas vezes são garagens ou cômodos adaptados que utilizamos para guardar as barracas, lonas, tábuas e o material dos artesãos) e como todas esses itens são pesados utilizamos camionetes para trazer o material do depósito até a feira, entretanto há equipes que utilizam de carrinhos adaptados e carregam esse peso todo com base no esforço braçal, falando em esforço braçal todo o serviço exige um bom preparo físico do montador: montar as ferragens é extenuante, trazer as mercadorias é desgastante, conferir se tudo está nos conformes é uma tarefa de extrema responsabilidade. Não temos idéia de quantos quilômetros andamos pela madrugada no centro histórico para que a feira enfim esteja pronta para a chegada dos expositores entre as 8 e 9 da manhã.

Para não tornar esse relato extenso demais não vou entrar em detalhes sobre os demais turnos. A rotina do montador exige mais 3 turnos de serviço, que é escostar as barracas e recolher o material, sábado de tarde é o turno mais curto que dura das 18 às 21 horas geralmente, voltamos aos nossos lares, descansamos e retornamos novamente as 3 da manhã para colocar as bancas nos devidos lugares, montar as barracas dos expositores que só vem aos domingos (é de preferência ou não do expositor vir aos sábados), e trazer todas as mercadorias, esse turno termina as 8 ou 9 da manhã. Novamente voltamos a nossos lares para nos recompor do trabalho da madrugada, retornamos a feira ás 18 horas e finalmente a desmontamos esse turno termina por volta das 1 hora da manhã de segunda feira.

Percebe – se pelos nossos horários de serviço que somos trabalhadores discretos, que apesar do nossa tarefa pesada, trabalhamos em horários que passam despercebidos pelos turistas. Vale ressaltar que somos trabalhadores informais, e que geralmente recebemos por turno de serviço, sem vínculo empregatício, sem direito a férias ou décimo terceiro. Apesar dos horários de trabalho bem complicados que desregulariza todo o nosso sono, nos felicitamos de ter pelo menos 5 dias da semana livre, então alguns de nós possui uma segunda ocupação para comprementar sua renda. Entretanto há aqueles que tem como ocupação de montador sua única fonte de renda, seu único meio de sustento.

Heis que pandemia mundial do Coronavirus nos impossibilita de reabrimos a feira por óbvias questões sanitárias. A última vez que trabalhamos foi no domingo 15 de março, então o Prefeito Ney Santos promulgou decreto fechando a feira por tempo indeterminado, e desde então passaram- se 15 finais de semana contando o dia de hoje (sábado 27 de junho de 2020), em que estamos impossibilitados de exercer nossa profissão. Por sermos trabalhadores informais conseguimos solicitar o auxílio emergencial, que sofre diversos problemas de organização e de regularidade nos pagamentos por parte do governo Federal. O auxílio que por si só já é um valor muito baixo para mantermos nossa sobrevivência, R$600 é um valor muito baixo para nós trabalhadores que pagamos aluguel e muitos de nós são pais de crianças pequenas, nossa remuneração não é elevada, então nenhum de nós possui alguma reserva, fundo ou poupança.

Chegou a nós duas informações que nos deu um pouco de esperança para suportarmos essa situação delicada, mas que nos foi de muita frustração. Foi vazado um áudio do prefeito Ney Santos a seu secretário Jones Donizete dizendo que iriam buscar ajudar nós montadores e expositores através da doação de cestas básicas, chegamos a preencher um formulário no site da cidade para recebermos tal ajuda .

Somos trabalhadores informais, sofremos preconceitos por parte de alguns membros da atual gestão que sempre nos acusam de sermos trabalhadores desregularizados por não pagarmos impostos sobre os nossos rendimentos. Eu afirmo que isso não nos torna menos trabalhadores, não nos torna menos dignos de assistência numa situação sanitária tão delicada. A tal cesta básica nunca nos foi entregue, o auxílio emergencial é insuficiente, nós montadores que somos quase sempre esquecidos estamos abandonados a nossa própria sorte.

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